Aprender a esquecer talvez seja o mais importante da vida, porque a vida é feita de perda!
Meu filho já deveria ter largado o bico. Seis anos de idade, francamente. Ele sabe disso, tanto que, neste ano, decidiu que entregaria o bico para o Papai Noel. Desde novembro vem falando:
– No Natal, vou dar o bico para o Papai Noel. Eu vou.
Bem. Contratei um Papai Noel. Um ótimo Papai Noel. Eu mesmo quase acreditei que fosse o próprio, vindo direto do Polo Norte com seu trenó voador. Quando ele chegou à porta, batendo sino, meu guri saiu correndo pela casa:
– O bico! Tenho que achar o bico!
De fato, mal o Papai Noel entrou, ele lhe estendeu o bico:
– Ó.
Depois, encheu o Papai Noel de perguntas. Sobre o clima da Lapônia, sobre a velocidade das renas, sobre o salário dos duendes que trabalham na fábrica de brinquedos. A festa prosseguiu, depois que o Papai Noel se foi, e o meu guri se distraiu com os brinquedos novos, sobretudo com um mínion, ele adora os mínions. Então, chegou a hora de dormir. A hora do bico. Nesse momento, acometeu-o uma violenta síndrome de abstinência.
– O bico! – implorava, aos prantos. – Quero o bico! Liga pro Papai Noel! Liga pro celular dele!
Tentei consolá-lo sugerindo que pensasse nos brinquedos que havia recebido.
Que tentasse esquecer do bico.
– Mas eu não consigo esquecer! – Ele gritava.
– Não consigo esquecer! – E, olhando para mim com os olhos rasos
d’água, pediu:
– Pai, me ensina a esquecer! Me ensina a esquecer.
Suspirei.
Disse que ia tentar. Que aprender a esquecer talvez seja o mais importante da vida, porque a vida é feita de perdas. Que, às vezes, é fundamental deixar de lutar, aceitar a derrota e seguir em frente, porque lá adiante tudo será novo e diferente e, decerto, melhor.
– Em certas ocasiões, a gente tem que desistir, meu filho. Simplesmente desistir. Porque, depois que a gente desiste, começa a esquecer, e vai esquecendo, vai esquecendo, até que um dia aquilo não faz mais falta e a gente olha e nem quer mais.
Ele esfregou os olhos. Aprumou-se na cama:
– Eu vou desistir do bico, pai.
– Isso. Isso...
– Porque é bom esquecer.
Eis a verdade. É bom esquecer.
Fonte: http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/geral/noticia/2013/12/david-coimbra-me-ensina-a-esquecer-4374960.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário